Vidas Secas (1938) - Graciliano Ramos
Autor e obra
Nasceu em Alagoas, em 1982, e teve 15 irmãos. Se envolveu,
durante sua vida, com educação e política.
Com o golpe de 1930 ( Era Vargas), se afasta da política e começa a se dedicar mais a seus romances.
Com o golpe de 1930 ( Era Vargas), se afasta da política e começa a se dedicar mais a seus romances.
Em 1933 volta como diretor da Instrução
Pública e realiza uma grande reforma na educação de Alagoas, sendo preso por 3 anos, sendo acusado de se envolver com o comunismo.
Após ser liberto passou a viver em uma
pensão, no Rio de Janeiro. Para pagar a conta em tal pensão, Graciliano, ao
atender um pedido de um amigo que desejava “umas histórias do Nordeste”, começa
a escrever Vidas Secas. Cada capítulo, conforme ficava pronto, era vendido para
ele conseguir se sustentar. Todo dia, antes de escrever algum capítulo de Vidas
Secas, Graciliano fumava três maços de cigarro e bebia um pouco.
Em 1945 se alia oficialmente ao Partido
Comunista Brasileiro.Em 1951 se torna presidente da Associação Brasileira de
Escritores. Morre em 1953 devido a um câncer.
Tempo e espaço
O livro se passa no sertão
nordestino, um lugar inóspito e monótono. A escassez das falas dos personagens
( que mal existe) se funde com a aridez do sertão. Era dificílimo encontrar um
emprego, quem dirá uma boa remuneração. Fabiano vivia em um processo de
semi-escravidão: trabalhava muito, ganhava pouco, além de ser roubado quando ia
receber do patrão.
Já o tempo em que a historia se desenvolve não é definido.
A história de Fabiano e sua família sempre aconteceu no
semi-árido nordestino.
Personagens
Fabiano: vaqueiro do sertão
nordestino gostava do meio rural, é violentado por instituições sociais,
sente-se diminuído e marginalizado, apresenta extraordinária capacidade de
resistência, constitui um “herói” problemático, marcado pela contradição entre
a revolta e a passividade, o que mais o atormenta é não ter o domínio da
linguagem (mal falava), acredita em poderes sobrenaturais.
Sinha Vitória: mulher de Fabiano, era
astuta. Seu maior sonho é ter uma cama, o que representa o alcance da
consciência de cidadania, pela necessidade de sentir que vive uma vida autêntica,
ocupada com os afazeres domésticos, para diminuir suas frustrações, nas horas
de aflição costuma apelar para Deus e para Virgem Maria, personalidade mais
dedicada, não tão tosca e primitiva como a do marido, é a âncora da família,
demonstra possuir certa destreza mental, além de ser guerreira e forte.
Os meninos: eram dois, filhos de
Fabiano e Sinhá Vitoria a ausência de nomes revela o processo de
despersonalização a que foram submetidas pelas injustiças sociais, a miséria
está relacionada com a ausência da fisionomia dos meninos. O menino mais novo,
ingênuo, vê no pai um modelo a ser seguido, o mais velho, é inquieto e movido
pela curiosidade.
Baleia: cachorra da família de
Fabiano, era tratada como gente, uma espécie de irmã para os meninos, magra,
vira-lata, os pontapés que recebe, deixam-na revoltada e, tal como os homens,
“cogita” a possibilidade de fuga, durante o livro ela sofre um processo de
“antropomorfização“.
Seu Tomás de Bolandeira: tido como exemplo de
sabedoria, como um indivíduo alfabetizado, sábio, culto, porém falido. É um
arquétipo em que as demais personagens se espelham, principalmente Fabiano.
Soldado Amarelo: simboliza o despotismo
dos militares, o amarelo significa, no imaginário popular, o desespero, o ódio
e a raiva, impõe-se com arrogância diante de Fabiano, prendendo-o.
Dono da fazenda: símbolo do poder
econômico opressor representa o imobilismo de uma estrutura social que, aliada
a outros elementos, acaba por determinar o nomadismo dos retirantes.
Fiscal da prefeitura: é um estágio menor das
instituições sociais, figura que representa a intolerância da máquina
governamental.
Análise da obra
- Vidas Secas é uma obra da
Segunda Fase Modernista, inserida no ciclo do romance regionalista nordestino
desenvolvido ao longo da década de 1930.
- É a obra que representa o
grau máximo de depuração estilística pela concisão e pelos efeitos de sentido criados
pelas manobras com a linguagem.
- O romance adquire uma
dimensão épica, por problematizar as precárias condições de sobrevivência no
sertão.
- Por trás dos
acontecimentos, surge o tema da utopia de justiça social. A chama da esperança
se sustenta na determinação com que os retirantes perseguem uma possibilidade
concreta de participação social. O direito à cidadania é o anseio maior de cada
personagem, cada um com suas particularidades.
-
A estrutura do romance é aberta. Graciliano, no início do livro anuncia o
anseio por um futuro melhor, registrando-a no futuro do pretérito (vestiriam,
remoçaria, engrossariam, provocaria, renasceria), para afirmar o quanto eles
sonham com essa possibilidade, mesmo sabendo dos imensos obstáculos que
impediam sua concretização.
- O romance termina como
começou, o que evidencia a circularidade que o compõe.
- As vidas se secam não só
fisicamente, mas também a alma das personagens, considerando a dificuldade que
sentem de estabelecer relacionamentos interpessoais.
- A linguagem rarefeita
espelha a degradação do universo no qual os retirantes vivem. Nos poucos
diálogos, se acumulam ruídos o que ocasiona a frustração do uso da linguagem.
Até o papagaio, em seu curto tempo de vida, aprendeu apenas a imitar latidos.
- A desumanização das personagens
e a humanização da cachorra Baleia é uma característica marcante do livro.
- Vidas Secas é um romance
áspero, a sua poesia é densa, apontando para a urgência da reforma agrária no
país.
- Os capítulos do livro são
autônomos, ou seja, o leitor tem a liberdade de escolher qual quer ler
primeiro.
- O foco narratico é em 3a
pessoa, apresentando um aspecto inovador para esse foco de relato: a
onisciência é prismática. Em Vidas Secas, o relato faz com que o leitor entre
em contato direto com a realidade, enxergando-a pelo prisma da personagem que
está em cena.
- No livro também há o
emprego do discurso indireto livre, que dá ao narrador-observador um
posicionamento discreto: sua "voz" quase se confunde com a das
personagens.
- Apesar de a cronologia
não estar explícita, cenas autônomas ("Mudança", "Inverno",
"Fuga") deixam transparecer algumas ordenações temporais mais
concretas que outras.
- A paisagem natural é tão
hostil que é possível falar da existência de um contra-espaço: o sertão
nordestino se torna o principal responsável pela expulsão dos sertanejos.
- Há a presença quase
absoluta de um monólogo interior, por não existirem praticamente diálogos.
Síntese
O livro se inicia com Fabiano, sua esposa
Sinhá Vitória, seus dois filhos e a cachorra Baleia andando no sertão. Eles já
caminhavam há alguns dias sem um destino. No dia anterior, eles haviam matado o
papagaio, pois estavam com muita fome.
Avistavam juazeiros, era uma fazenda
abandonada. A cachorra Baleia caçou um preá, o que animou toda a família.
Fabiano e Sinhá Vitória estavam esperançosos, pois uma grande nuvem se formava
no céu: iria chover. Fabiano pensava que finalmente teria chance de recomeçar,
de se tornar o fazendeiro daquele lugar abandonado.
A chuva chegou e o fazendeiro também, o que
desconcertou Fabiano. Ele implorou para ficar e o fazendeiro aceitou, lhe dando
alguns materiais, como botas.
O fazendeiro vinhas às vezes e sempre
reclamava grosseiramente dos serviços de Fabiano, apesar de estar tudo em ordem
e do gado estar crescendo. Fabiano sabia que quando a seca retornasse, ele
seria despedido, pois não haveria maneiras de manter o gado.
O patrão era autoritário, sem-educação e o
enganava na hora de pagar. Durante esses dias de trabalho, Fabiano chegou a
pensar que era um homem, mas depois se corrigiu dizendo que era um bicho. “Sim
senhor, um bicho, capaz de vencer dificuldades”.
Fabiano acreditava que seus filhos tinham que
ser igual a ele, trabalhar em uma fazenda e não igual ao Seu Tomás da
Bolandeira, que possuía um monte de livros e que estava em uma situação ruim.
Um dia Fabiano foi até a cidade para comprar
umas coisas. Entrou em um bar e bebeu apenas um copo de cachaça. Após isso, um
soldado amarelo o chamou (sendo mais uma ordem do que um pedido) para jogar
baralho com apostas em dinheiro. Fabiano perdeu o pouco do dinheiro que lhe
restava e foi embora, sem se despedir do soldado amarelo. Já estava na rua
quando o tal soldado o perseguiu. Fabiano, após receber um pisa no pé, xingou a
mãe do soldado, sendo preso.
Quando chegou à prisão foi espancado. Não
conseguia entender porque aquilo tinha acontecido. Não conseguia se explicar
para o delegado, mal sabia falar. Não acreditava que o soldado amarelo fez tudo
aquilo com ele só porque ele não se despediu. Pensava em Sinhá Vitória e nos
meninos, que já deviam estar preocupados com sua demora. Os meninos
provavelmente seriam como ele quando crescerem: brutos, e seriam “pisados” por
soldados amarelos sem chance de se defender. Não se diz no livro, mas se deduz
que Fabiano logo foi solto.
Em um dia na fazenda, Sinhá Vitória, já
exausta doas afazeres domésticos, discutiu com Fabiano, pois queria uma cama
decente, como a de São Tomás de Bolandeira e não uma de palha. Ela se queixou
do dinheiro que ele gastava bebendo e jogando e ele se queixou dos sapatos
caros que Sinha Vitória usava em festas, dizendo que ela andava como um
papagaio, o que a machucou muito (além da humilhação, ela se lembrou do
papagaio que tiveram que matar). Para aumentar a raiva e a angústia de Sinhá
Vitória, uma raposa comeu sua galinha mais gorda.
Certa vez, o menino mais novo ficou admirando
seu pai, Fabiano, enquanto domava uma égua na fazenda. Ele teimou que tinha que
fazer algo parecido para impressionar sua família. Foi tentar se aproximar de
Fabiano, Sinha Vitória, de seu irmão e da Baleia e todos os ignoraram. No dia
seguinte, montou em um bode para impressionar seu irmão e caiu provocando risos
e reprovação aos expectadores, sentindo-se humilhado.
O menino mais velho havia ouvido de uma
senhora que curou a espinha de seu pai (conhecida com Sinha Terta) a palavra
“inferno”. Se encheu de curiosidade, queria aprender o que “inferno”
significava e se gabar para o irmão. Foi perguntar para Sinha Vitória que
respondeu que era apenas um lugar ruim. Não satisfeito com a resposta, recebeu
um cascudo. Foi chorar perto de uma árvore, indignado com a atitude da mãe.
Apesar dela ter lhe falado que “inferno” era um lugar ruim, para ele era uma
palavra tão bonita. Baleia veio consolá-lo. Depois de se recuperar, tentou
explicar a ela o que Sinha Vitória tinha feito, com um vocabulário tão escasso
quanyo o do papagaio que eles haviam comido para sobreviver.
Já estava anoitecendo e o menino mais velho
estava receoso de entrar em casa. Queria esquecer que havia levado um cascudo
por uma simples pergunta. Abraçou Baleia, a qual odiava ser apertada (preferia
pular), mas que se encolheu para não decepcionar o menino mais velho. Ela
imaginava o osso que poderia ganhar de Sinha Vitória.
O inverno chegou. Passavam-se dias e noites
seguidas chovendo. A família se juntava em volta da fogueira tentando se aquecer,
aquele era o período do ano em que havia mais “fartura”.
Pela primeira vez, Graciliano Ramos fala dos
sentimentos de Fabiano em relação ao soldado amarelo. Logo quando saiu da
prisão, pensou em matar o tal soldado, o delegado e o juiz, caso a seca
chegasse. Mas agora chovia e o rio subia a ladeira. Uma possível enchente
preocupava Sinha Vitória. E se a água chegasse até a casa? Eles teriam que
subir o morro e permanecer lá por alguns dias.
Fabiano e sua família, inclusive Baleia,
foram para uma festa de natal na cidade. A caminhada era longa, aproximadamente
3 km. Fabiano ia com roupas apertadas feitas por Sinha Vitória, com uma bota de
vaqueiro e ela ia com um vestido vermelho e um salto alto (que a
desequilibrava) e os meninos com roupas feitas por Sinhá Terta. Fabiano tentava
não perceber essa desvantagem.
Durante a caminhada, eles tiraram os sapatos,
chegando na cidade com os pés embarreados. Lá acharam uma bica, se limparam e
colocaram os sapatos novamente.
A festa já havia começado e eles estavam no
meio da multidão. Fabiano se sentia inferior e sentia raiva, achava que todas
as aquelas pessoas eram parecidas com o soldado amarelo. Com o pouco de
dinheiro que tinha comprou cachaça. Embriagado, quis “arrumar briga” com as
pessoas. Xingava, provocava e por sorte ninguém ouviu. Se o soldado amarelo
aparecesse ali, Fabiano bateria nele.
Cansado e bêbado, tirou o sapato apertado, o
colarinho e a camisa, enrolou, e a fez de travesseiro. Acabou por adormecer
numa calçada. Sinha Vitória, extremamente apertada para xixi, urinou em uma
calçada próxima.
Os meninos estavam surpresos com a quantidade
de pessoas, com as barracas, as lojas, as luzes. Não conseguiam acreditar que
tudo aquilo tinha nome, era impossível aquelas pessoas da cidade saber todos os
nome. Baleia queria ir embora, havia muitas pessoas diferentes, muitos odores
diferentes.
Passado um tempo, Baleia adoeceu. Estava
magra, com diversas partes do corpo sem pelos. “Estava para morrer.” Fabiano
decidiu matá-la com uma espingarda, preparando-a bem para Baleia não sofrer
muito. Ele também sentia dó, mas acreditava que a doença de Baleia não tinha
mais cura.
Sinha Vitória pegou os dois meninos e os
enfiou no quarto, tampando-lhes os ouvidos. Os meninos perceberam o que ia
acontecer e relutaram muito, afinal Baleia era um membro da família.
Fabiano atirou em Baleia e inutilizou uma de
suas pernas traseiras. A cachorra fugiu sem entender o motivo do dono de ter
feito aquilo. Sentia vontade de morder Fabiano, mas como poderia fazer isso?
Ele era o seu dono, ela jamais poderia fazer isso com ele. Adormeceu com a dor.
Acordou quando já era a noite, sem entender onde estava e o que havia
acontecido. Pensando em preás, em um Fabiano gigante, nos dois meninos, em um
lugar lindo, adormeceu novamente, desta vez para sempre.
Fabiano foi receber sua parte do gado que
cuidará do patrão na cidade. Sinha Vitória havia contado o quanto ele precisava
receber, usando várias sementes. Apesar de ter poucos conhecimentos, era ela
quem calculava as despesas da casa. Mas chegando lá, o patrão lhe pagou um
valor muito menor daquele que lhe era por direito. Fabiano contestou e o
patrão, bravo, disse para ele arranjar emprego em outro lugar. Fabiano se
acalmou, afinal, ele não tinha outro lugar para trabalhar.
Fabiano saiu indignado. Ele não tinha onde
cair morto, senão acusaria o patrão de ladrão e iria trabalhar em outra
fazenda. Repensou, era impossível, ele mal sabia se expressar para conseguir
outro emprego. Sentia raiva, quis beber, mas se lembrou que da última vez que o
fez o soldado amarelo o prendeu. Por final, comparou, em sua mente, o patrão
com o governo, especialmente porque o patrão usava, como o governo, uma
linguagem que estava além de seu entendimento
Já havia se passado um ano desde a prisão de
Fabiano quando este estava na Caatinga procurando uma égua e sua cria, quando
encontrou o soldado amarelo.
Primeiramente, Fabiano colocou o facão no
rosto dele, mas vacilou. Depois de muitos pensamentos invadirem sua cabeça,
tornando-o cada vez mais indeciso em se vingar ou não do soldado amarelo, ele
achou melhor deixá-lo prosseguir e lhe ensinou o caminho, afinal pensou:
“governo é governo”.
A seca “apertava”, os poços secaram. Um bando
numeroso de aves vinha beber água no poço. Sinhá Vitória disse que o gado ia
morrer por causa das aves. Fabiano demorou a entender que o gado ia morrer por
que não ia ter mais água para beber (as aves iam beber tudo). Achava que Sinhá
Vitória quis dizer que as aves matariam e comeriam o gado. Admirou sua esposa
pelo “complexo pensamento”.
Pegou a espingarda e foi atirar nas aves (era
a comida da semana). A espingarda o fez lembrar-se de Baleia, sentia dó da
cachorrinha. No caminho até o poço se arrependeu de não ter assassinado o
soldado amarelo: mesmo se fosse preso, se tornaria um homem. Se arrependeu também
de não ter se tornado um cangaceiro. Era um covarde, era um bicho, não merecia
respeito (seus pensamentos).
Matou uma série de aves. Sentia raiva, queria
matar o soldado amarelo e seus superiores, sentia raiva do patrão, sentia raiva
de ter matado Baleia. Pegou os corpos das aves, necessitava fugir dali, da
seca, das lembranças de Baleia (não sabia se foi certo tê-la matado), do patrão
que o roubava.
A seca havia chegado e eles decidiram partir.
Mataram um bezerro, salgaram a carne e começaram a caminhada. Não sabiam para
onde ir, andaram para o sul. Na caminhada, Fabiano e Sinha Vitória
“conversavam” (pouquíssimas palavras), um tentando dar esperança ao outro. No
meio do dia, pararam em uma sombra.
Fabiano viu uma depressão e achou que ali
tinha um poço. Não sabia ao certo, mas precisava acreditar. Começou a pensar no
cavalo que tinha abandonado na fazenda, não podia levá-lo, era do patrão. Ia
morrer, magro com os urubus comendo seus olhos. Esse pensamento o incomodou,
voltaram a andar, desta vez em direção ao poço.
Assim termina o livro, semelhante ao começo,
dando a ideia de um ciclo: eles iriam para outro lugar e iam ser enganados. A
seca, após um tempo, chegaria, e eles partiriam novamente.
Texto de Graziella Toffolo Luiz
quero fazer uma pergunta
ResponderExcluirPor que Fabiano acaba não recebendo o que calculava?
O que Fabiano pensava de si mesmo?
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